Os Votos

Arte: Josephine wall

“ Pois, desejo primeiro que você ame e que amando, seja também amado,
E que se não o for, seja breve em esquecer e esquecendo, não guarde mágoa.

Desejo depois que não seja só, mas que se for, saiba ser sem desesperar.

Desejo também que tenha amigos e que, mesmo maus e inconseqüentes, sejam corajosos e fiéis,
E que em pelo menos um deles você possa confiar, que confiando, não duvide de sua confiança.
E porque a vida é assim, desejo ainda que você tenha inimigos, nem muitos nem poucos,
Mas na medida exata para que, algumas vezes, você se interpele a respeito de suas próprias certezas
E que entre eles haja pelo menos um que seja justo, para que você não se sinta demasiadamente seguro.

Desejo, depois, que você seja útil, não insubstituivelmente útil,
Mas razoavelmente útil. E que nos maus momentos, quando não restar mais nada,
Essa utilidade seja suficiente para manter você de pé. Desejo ainda que você seja tolerante,
não com os que erram pouco, porque isso é fácil, mas com aqueles que erram muito e irremediavelmente,
E que essa tolerância não se transforme em aplauso nem em permissividade,
Para que assim fazendo um bom uso dela, você dê também um exemplo para os outros.

Desejo que você, sendo jovem, não amadureça depressa demais e que, sendo maduro,
não insista em rejuvenescer e que, sendo velho, não se dedique a desesperar.
Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor e
é preciso deixar que eles escorram dentro de nós.

Desejo, por sinal, que você seja triste, mas não o ano todo,
nem em um mês e muito menos numa semana, mas apenas por um dia.
Mas que nesse dia de tristeza, você descubra que o riso diário é bom,
o riso habitual é insosso e o riso constante é insano.
Desejo que você descubra com o máximo de urgência, acima e a despeito de tudo,
Talvez agora mesmo, mas se for impossível, amanhã de manhã,
que existem oprimidos, injustiçados e infelizes,
e que estão à sua volta, porque seu pai aceitou conviver com eles.
E que eles continuarão à volta de seus filhos, se você achar a convivência inevitável.

Desejo ainda que você afague um gato, que alimente um cão
e ouça pelo menos um joão-de-barro erguer triunfante o seu canto matinal.
Porque assim você se sentirá bem por nada.

Desejo também que você plante uma semente,
por mais ridícula que seja, e acompanhe o seu crescimento dia-a-dia,
para que você saiba de quantas muitas vidas é feita uma árvore.

Desejo, outrossim, que você tenha dinheiro, porque é preciso ser prático.
E que, pelo menos uma vez por ano, você ponha uma porção dele na sua frente e diga:
Isso é meu. Só para que fique bem claro quem é dono de quem.

Desejo ainda que você seja frugal, não inteiramente frugal,
não obcecadamente frugal, mas apenas usualmente frugal.
Mas que esse frugalismo não impeça você de abusar quando o abuso se impõe.

Desejo também que nenhum dos seus afetos morra, por ele e por você.
Mas que, se morrer, você possa chorar sem se culpar e sofrer sem se lamentar.
Desejo, por fim, que sendo mulher você tenha um bom homem,
E que sendo homem, tenha uma boa mulher.
E que se amem hoje, amanhã, depois, no dia seguinte, mais uma vez,
E novamente, de agora até o próximo ano acabar,
E que quando estiverem exaustos e sorridentes,
ainda tenham amor para recomeçar.
E se isso só acontecer, não tenho mais nada para desejar. ”

( Sergio Jockymann)


@->-O lamento da velha escada de madeira

Ontem eu resolvi visitar uma senhora muito sábia e amiga a quem não via há muito tempo. Foi uma tarde agradável regada por um delicioso café. Conversamos sobre assuntos diversos e ela me falava do seu passado ora com saudade, ora com tristeza, quando de repente uma lágrima rolou na sua face e eu perguntei a razão... Ela fitou-me nos olhos e disse com pesar: na minha vida inteira eu sempre fui uma escada e hoje já não sou mais nada além de um objeto inútil jogado num canto qualquer. Pensei por alguns instantes... Imaginei todo o processo para a construção de uma escada desde o machado afiado nas mãos do homem derrubando uma árvore cheia de vida e aquela cena cada vez mais nítida na minha mente. A jovem e cobiçada escada - servindo de idas e vindas facilitando a vida dos seus usuários, encurtando distâncias, aproximando do alvo objetivado. Com o passar dos anos ela fora ficando gasta – velha e já sem utilidade alguma além do fogo ou o lixeiro. Já não podia mais se recompor e voltar à floresta de onde fora brutalmente arrancada. Por fim, meio sem jeito e perdida nas palavras respondi: entendo que a senhora passou sua vida toda ajudando outras pessoas e esqueceu-se de si mesma, porém não se esqueça de que até mesmo a velha escada plantou boas sementes. Chegar até aqui não foi por acaso e certamente a herança sua como escada será entregue e bem distribuída aos seus posteriores...
Despedi-me daquela anciã que outrora fora tão linda, pois ainda conservava traços marcantes de beleza singular dos seus anos dourados. Desde então, estou sempre refletindo sobre o que é ser “escada velha” deixada para trás...

-Dora Vitoriosa-

Saber



No estar e no querer,
na grandeza da alma
que faz a calma
na serenidade das coisas
e na instabilidade do tempo!
Porque gente é pessoa da terra
que faz crescer a vida.
Por isso:
Criamos, criamos, criamos!
Alimentados pela força
que nos vem das entranhas,
mesmo parecendo por vezes
cansados.
Quase esgotados
Não em nós!
Não por nós!
Mas no olhar das pessoas
para quem criamos, criamos, criamos!
E a obra cresce!
E vida brota generosamente,
porque gente é pessoa
e as pessoas amam a vida
e todas as coisas
que dão vida ao nosso olhar.
E porque amamos
Então:
Criamos, criamos, criamos!...
E por que somos obra do Criador,
e dessa fé nos alimentamos
Então:
Eternamente criamos, criamos, criamos!

(Angelino Pereira)

MEU GRITO

Imagem: olhares.uol.com.br




Mundo de coisas e não de seres,
Cada cabeça com seus afazeres:
Chocam ideias respondem com guerra;
Constroem as armas destroem a Terra;
Matam crianças que gritam de fome;
Inventam o mundo que nos consome;
Encurtam o tempo que o tempo me dá;
Semeiam o ódio matam o amor.
Funesto mundo o que nos dá?
Martírio e lágrimas com muita dor!


(Angelino Pereira)